terça-feira, 15 de outubro de 2013

De professor, um dia

Professor 

De um sorteio, o pequeno mimeógrafo.
De um canto da parede, o quadro a giz.
De um grupo de bonecos de pano e bichos de pelúcia, as provas a serem corrigidas.
De umas memórias, a alfabetização de desconhecidos.
De cada escola à beira da estrada, a afinidade.
De diários e tarefas, a substituição.
De encontros em encontros, a pulsão da aula.
De passagem, o ritual do afeto.
De sensibilidades, a violência da educação que marca.

De contágio, a transmutação.
De linhas variantes, a janela e os descascados da tinta que envelhece.
De desenhos ondulantes na paisagem, o verde das montanhas e o precipício da partida.

Da cantina, o mingau.
Da invenção, a resistência.
Da fuga, a impossibilidade.
De viver, o possível efêmero.

Espera confeccionando pensamentos por fios que se emaranham, e que quando puxados, enroscam-se enovelados em superfícies cuja plasticidade opaca e disforme são as variações em multiplicidade que todo ser quase é e está.


Do grito, a respiração.
Do suspiro, o retorno.
Da fala, o abandono da voz.

Do sorriso, a vaga lembrança da primeira vez na escola.
Do choro e da persistência de se esvaziar do lugar, o sempre traço 
escola.


Antonio Carlos Amorim - Presidente da Associação de Leitura do Brasil

Memorial do Concurso de Livre Docência
Unicamp - 2011